DINHEIRO (SP) • NEGÓCIOS • 21/8/2011
De olho em um mercado de US$ 10 bilhões, o empresário Bazinho Ferraz abre as cortinas da XYZ Live, empresa de shows, eventos e marketing esportivo
Um avião cargueiro e outro de passageiros. Um batalhão com pelo menos 4,5 mil profissionais entre músicos, empresários, assistentes, engenheiros de som, seguranças e motoristas. Se você estiver na plateia dos shows que o superstar americano Eric Clapton fará no Brasil em outubro, antes de “viajar” nos primeiros acordes do músico, lembre-se de que foi preciso mobilizar toda a estrutura descrita acima até o sagrado momento da apresentação. E pode ter certeza, a brincadeira não saiu por menos de R$ 15 milhões, incluindo cachê do artista, aluguel dos espaços para os shows e providências como a comercialização de ingressos. Clapton faz parte de uma extensa lista de artistas de primeira linha trazidos ao Brasil pela mais nova empresa do ramo de entretenimento do País, a XYZ Live, que nasce com receita estimada em R$ 180 milhões em 2011 e projeção de chegar em 2015 com faturamento de R$ 610 milhões.
O montante significa que a nova empresa vai crescer acima dos 35% ao ano. “Espaço para isso é o que não falta”, afirma Bazinho Ferraz, presidente da XYZ Live. Pelos cálculos do empresário, só o mercado de entretenimento no Brasil deve sair do atual R$ 1,5 bilhão para R$ 2 bilhões de receita nos próximos cinco anos, num ritmo de crescimento de 9% ao ano. Nos esportes, os números são ainda maiores. Com estabilidade política e econômica, população jovem e com dinheiro no bolso, o Brasil virou destino obrigatório para os megashows internacionais. Das dez maiores turnês de artistas estrangeiros realizadas na temporada 2010/2011, nada menos que cinco passaram por aqui. U2, Paul McCartney e Metallica são apenas alguns nomes que atraíram multidões para suas apresentações. E é nesse mercado que a XYZ Live quer surfar. Mas não apenas por aqui: na verdade, a empresa de Ferraz está de olho numa máquina de fazer dinheiro, que arrecadou US$ 10 bilhões em todo o mundo, no ano passado, de acordo com a consultoria americana Pollstar, especializada em show biz. Há um verdadeiro leilão das empresas organizadoras desses eventos disputando cada artista, cada show ou festival. Por isso, quem quiser ser mais do que um mero figurante e obter sucesso nesse mercado tem de se associar a uma empresa internacional com forte tradição na área para entrar nos leilões e vencer o páreo. No caso da XYZ Live, esse papel é da Evenpro, empresa com mais de 26 anos de mercado, com sede em Miami, e sócia da XYZ Live nas megaturnês.Quem comanda a Evenpro é o empresário Phil Rodriguez, que convenceu Amy Winehouse a cantar por aqui em fevereiro deste ano. Para quem acha estranho que a XYZ Live coloque apresentações no currículo que aconteceram antes de a empresa nascer, cabe uma explicação. Desde 2006, o paulista Bazinho Ferraz, 39 anos e formado em administração pela PUC de São Paulo, é sócio do grupo ABC, um dos 20 maiores conglomerados de comunicação e marketing do mundo. Até maio deste ano, ele respondia pelo desenvolvimento das áreas de branding e con-teúdo o que envolve desde a realização de shows, eventos e espetáculos à criação de eventos próprios para as empresas. Foi Ferraz quem idealizou o festival de música eletrônica Skol Beats e o Super Casas Bahia, que mistura vendas de eletrodomésticos com shows de personagens da Disney. O XYZ, portanto, era um braço do Grupo ABC. O negócio deu tão certo que o ABC resolveu dar CNPJ e endereço corporativo próprios à XYZ Live. O spin-off, a transformação da unidade de negócio em empresa independente, está acontecendo agora. Além do Grupo ABC, que tem em sua composição acionária os publicitários Nizan Guanaes, Guga Valente e Sérgio Valente, mais o banco Icatu e o fundo de investimentos Gávea, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, a XYZ Live negocia a entrada de um sócio investidor, que deverá aportar cerca de R$ 150 milhões. Com esse montante, a empresa continuará com uma forte política de aquisições meio pelo qual Ferraz prevê o crescimento acelerado dos negócios e também das áreas de atuação. A mais recente operação nesse sentido foi a incorporação da paulista Esfera. Dona da marca 02, a Esfera é uma das principais empresas especializadas em organização de corridas de rua do País, um segmento que movimenta nada menos que R$ 3 bilhões por ano com a venda de material esportivo e de patrocínio. Com um mar tão extenso de possibilidades, seria ingênuo imaginar que a atuação da XYZ Live ficará restrita à organização de shows e à comercialização de espaço para patrocinadores. A nova empresa vai atuar em seis frentes de negócios: entretenimento, cultura, conhecimento/relacionamento, esportes, futebol e moda. Não falta expertise nem alianças com os principais nomes de cada uma dessas áreas. O empresário Paulo Borges, responsável pela São Paulo Fashion Week, e Monique Gardenberg, da Duetto Produções e responsável por turnês como as dos Rolling Stones e de Elton John pelo Brasil, são apenas dois exemplos. Na ampla lista de serviços prestados pela XYZ Live há desde a realização de turnês, como a que trouxe a badalada banda americana BlackEyed Peas ao Brasil até o gerenciamento da imagem de craques do futebol como Elano, do Santos, Ramirez, do Chelsea, e Luizão, do Benfica.
Segundo Ferraz, só nessa seara, já há 50 atletas em negociações e em vias de fechar contrato com a XYZ Live. “Também estamos atuando em patrocínios, venda de ingressos, de direitos de transmissão de eventos e merchandising.” O horizonte das aquisições não ficará restrito ao mercado brasileiro. “Vamos entrar fortes na América Latina, sobretudo na Argentina, no Chile e no Peru”, diz Ferraz. As parcerias também não estão descartadas, como a que a XYZ Live acaba de fechar com a americana Creativity Artists Agency, de Los Angeles. Trata-se da segunda maior empresa de compra de shows e de representação de artistas do mundo.
Com o acordo firmado, a XYZ Live passa a representar os clientes da CAA no Brasil e, na mão inversa, terá seus artistas e esportistas representados pela CAA no Exterior. Com o crescente interesse de empresas e artistas estrangeiros pelo Brasil, as alianças com parceiros fortes na área lá fora é uma questão de sobrevivência. Pois, se a perspectiva é de que não faltem negócios para a XYZ Live, certamente também não faltará concorrência. Com o aquecimento dos negócios, sobretudo nas áreas do entretenimento e do marketing esportivo, quem já estava no mercado tratou de se fortalecer. É o caso da Time for Fun, a maior empresa brasileira do setor, que, em abril deste ano, abriu o capital e conseguiu captar R$ 539,3 milhões na bolsa de valores. Hoje, pouco mais de três meses depois da injeção de recursos, a Time for Fun já registra receita na casa dos R$ 580 milhões. No final do ano passado, foi a vez de os grupos RBS, do Rio Grande do Sul, e as Organizações Globo unirem forças para criar a Geo Eventos. Para completar o time, quem entrou recentemente nesse campo foi o jogador Ronaldo Fenômeno, que, antes mesmo de pendurar as chuteiras, já havia oficializado o lançamento da 9ine, empresa de marketing esportivo e gerenciamento de imagem de atletas. No cenário global, a XYZ Live terá de lutar contra titãs para garantir um lugar no palco. As líderes globais do mercado de shows são a Live Nation Entertainment, seguida de perto por outros gigantes americanos, como a William Morris Endeavor Entertainment, de gerenciamento de artistas. A Live Nation Entertainment, resultado da fusão entre a Live Nation e a Ticketmaster, é a principal empresa de shows do mundo, com faturamento de US$ 5 bilhões em 2010. Ela detém contrato com grandes artistas como o U2, controla casas de espetáculos nos Estados Unidos e administra a venda de ingressos. Além da corrida pelos melhores negócios na área, as empresas do setor travam uma árdua batalha pela compra de companhias menores, mas com nomes consolidados no mercado. A Geo Eventos adquiriu o controle da empresa de seminários HSM. Já a Planmusic teve 60% de seu capital arrematado pela Traffic, a maior empresa brasileira de marketing esportivo. Por melhores que sejam as perspectivas de faturamento no mercado de esportes e entretenimento, a pergunta que fica é: há espaço para tantas empresas? “A indústria do entretenimento e do esporte é uma ótima solução para as marcas que querem se aproximar de seu público”, afirma Clarisse Setyon, da Escola Superior de Propaganda e Marketing. E é nisso que Bazinho Ferraz está apostando suas fichas (leia entrevista abaixo). “Nosso espelho é a CAA, agenciadora do Justin Bieber”, diz Ferraz. Ele lembra que o adolescente sensação do momento foi transformado em filme, seriado e tem sua carinha de anjo inocente estampada nos mais diversos produtos. “Não temos a pretensão de ser os primeiros do mercado”, afirma Bazinho. “Mas queremos que cada uma das áreas de atuação traga um pedaço importante do nosso faturamento. Este é o nosso plano de negócios, a exemplo do que faz o Grupo ABC.” Inquieto, ele não esconde que está se preparando para entrar em mais uma negociação para trazer ao Brasil uma daquelas bandas arrasa quarteirão. Mas isso é só para 2012. Por enquanto, a agenda de shows e eventos comandada pela XYZ Live está muito bem servida.
Entrevista: O homem que trabalha nos bastidores O que não falta a Bazinho Ferraz é experiência na organização de shows e eventos. Aos 15 anos, já era o responsável pelas festas dos amigos. A mãe do empresário, dona Maria Aparecida, costuma dizer que o filho nunca lhe deu dores de cabeça. “Embora goste de uma boa balada, Bazinho soube transformar o gosto em um meio de vida”, diz ela. A seguir, a entrevista que o empresário concedeu à DINHEIRO. Quais são os riscos na realização de megashows? É uma operação gigantesca e não se pode errar nos detalhes. E eles não são poucos. Não se pode marcar um show a céu aberto numa época do ano em que são grandes as possibilidades de chuva. A venda de ingressos deve ocorrer próxima às datas tradicionais de pagamento de salários. Você precisa calibrar muito bem o tamanho do espetáculo com o preço do ingresso para não correr o risco de ter prejuízo ou de ter pouca gente na plateia. Mas tudo isso tem de casar com a agenda do próprio artista. Quem assiste a um megaespetáculo não tem ideia do que se trabalhou nos bastidores para chegar até ali. Por que os ingressos custam tão caro no Brasil? Primeiro, por conta da logística de transporte. Para um grande nome internacional se apresentar nos Estados Unidos ou na Europa é muito fácil. Tudo é perto. Um artista como Eric Clapton pode rodar a Europa em uma semana. Aqui não. Aqui as distâncias são enormes e não há infraestrutura de transporte. Isso encarece, e muito, qualquer apresentação. Nos Estados Unidos, um grande show se sustenta sem ajuda de patrocinadores. No Brasil, isso é impossível. Para as empresas, qual é a vantagem em investir grandes somas para trazer ao Brasil um Justin Bieber, por exemplo? Antes de mais nada, é preciso verificar a pertinência entre o artista, ou o evento, e o público que a marca quer atingir. A empresa ou a marca patrocinadora ganham também com a exposição na mídia e, depois, podem usar o evento para ações de relacionamento com quem interessa para elas. Podem levar clientes para uma área VIP num show, como o do Justin Bieber ou do Eric Clapton. Podem fazer promoções para premiar consumidores. Enfim, as possibilidades são enormes e há uma coisa importantíssima nisso tudo: a experiência que a marca ou a empresa vai gerar para o público que quer alcançar, seja ele o consumidor ou um cliente importante. O patrocínio é a única fonte de receita dos eventos? É, talvez, a mais importante. Mas não é a única. Há os ingressos e tudo o que gira em torno do artista. É nisso que estamos trabalhando. Estamos ampliando as possibilidades de explorar um artista, um evento como forma de dar visibilidade às marcas. Sua meta é transformar a XYZ Live na maior empresa de eventos do País? Sinceramente, isso não é o mais importante. Pode acontecer, naturalmente, mas, no nosso plano de negócios, a meta é que cada área da XYZ Live traga um pedaço importante do faturamento. Estamos em marketing esportivo, em shows, eventos empresariais, com a realização de fóruns e seminários, e temos moda, como a São Paulo Fashion Week. Enfim, temos atuação em áreas importantes e, se nos tornarmos os maiores, será mera consequência do trabalho que estamos fazendo e não por ser um objetivo perseguido. Como está a infraestrutura para shows no Brasil? Falta tudo aqui. Não temos arenas, as estradas para deslocar equipe e aparelhagem são ruins. Mas creio que esse quadro se reverterá com as obras que já estão sendo feitas para a Copa do Mundo e para a Olimpíada.
Colaborou Rafael Freire
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